A ilustre moradora de São Lourenço Martha Braga Mendonça comemorou 100 anos em dezembro de 2023 e nos deixou no último dia 27 de maio
Um pouco mais de D Martha:
(Palavras de sua sobrinha)
Quando lhe perguntavam sua idade,
“Quantos anos você tem, Martha?”
“Ah, muitos… (ri)
“Quando você nasceu?”
“No dia seguinte…”
O bom humor e a inteligência sempre foram características da personalidade de Martha. Segunda filha de uma família de oito crianças, nascida na cidade de Brazópolis-MG, Martha veio com as irmãs e a mãe para São Lourenço há,aproximadamente, 80 anos, após o falecimento de seu pai e o adoecimento grave de sua irmã mais velha, Joanita Mendonça. São Lourenço seria, para a família, um lugar de cura, afeto e de esperança renovada.
Seu avô, Martinho Braga, e sua avó Mariquinha Braga, já viviam em São Lourenço em uma casa verde, construída por eles, que ficava em frente à padaria São Lourenço eque,posteriormente, foi comprada pelo Dr. Emílio A. Póvoa. Há alguns anos, esta casa foi demolida para dar lugar ao edifício da Faculdade São Lourenço. Nesta nova edificação, não se preservou a fachada histórica da antiga casa verde, algo que ocorre em várias construções arquitetônicas pós-modernas. Dizem que a demolição da casa verde foi a mais difícil de ser feita na cidade. Era uma casa bem construída, de fato, sólida e bonita.
Afinal, Martinho Braga era um homem que gostava das coisas bem-feitas, gostava de arte, engenharia e também gostava muito de São Lourenço, participando de tudo que podia para o crescimento da jovem cidade, seja construindo uma casa, seja doando um dos doze vitrais da Igreja Matriz (a Basílica Menor de São Lourenço Mártir).
Força, resistência e persistência sempre foram marcas desta família, os Braga e, depois, de quem gerou Martha, os Braga Mendonça, expressando tais características em circunstâncias diversas.
Martha, por cerca de 50 anos cuidou diretamente de sua irmã mais velha, Joanita Braga Mendonça, acometida por um problema grave de saúde emocional que a impedia de se mover bem a fim de realizar suas atividades diárias e deslocamentos. Martha a acolheu e, com força, resistência, persistência, como também bom humor, cuidou diariamente de sua irmã poeta e musicista que, por muitos anos, publicou seus poemas e músicas no São Lourenço Jornal, editado anteriormente pelo Frei João da “gráfica” da Paróquia da cidade.
É de Joanita, junto com outra irmã, a caçula, Josette Braga de Mendonça, a autoria do Hino da Paróquia de São Lourenço. Josette, falecida em 2016, professora, diretora escolar e criadora de uma pedagogia original e inovadora implementada na histórica Escola Externato São Francisco, sempre que possível convidava Martha para compartilhar seus conhecimentos com as crianças que estudavam no Externato, como também com as professoras.
Martha possuía conhecimentos específicos sobre plantas, além de ter habilidades manuais e culinárias variadas. Qualquer conversa com ela parecia ser uma aula diferente e instigante. Receber incentivo para sair de casa, ter um convívio social, como fosse possível, era também um ato de liberdade para ela.
Conviver com Martha, Josette sabia, era, uma aprendizagem e alegria constantes. E ela também ensinava, afeto e generosidade.
Martha sempre disse do seu desejo de estudar agronomia. Tinha afeto imenso pelas plantas e a agricultura, além de grandes habilidades para tal atividade. Não conseguiu fazer isso diante da tarefa diária de cuidados familiares e trabalhos domésticos que lhe foram destinados. Fez, então, do quintal de sua casa, seu mundo, da cozinha, um laboratório de experiências doces, das agulhas em máquina de costura de pedal e bordados, várias reinvenções em tecidos.
Da educação escolar que recebeu, Martha a aproveitou de outro modo.
Sua formação na “escola feminina de economia doméstica” sulmineira, de referência pedagógica belga e que objetivava a “boa permanência de um casamento com o homem”, nas palavras de Wenceslau Braz, a auxiliou em sua força, resistência e persistência no viver com sororidade em um lar que foi compartilhado com sua mãe, irmãs e sobrinha. Mas, desta escola também guardou lembranças do prazer das aulas de ginástica e dança.Filhos? Bem, ficou somente com a primeira parte do poema de Vinícius de Moraes: “Filhos, filhos? Melhor não tê-los!”. Mas isso não significou ausência do exercício da maternagem, muito ao contrário. Sou prova viva disso. Sua alta responsabilidade no cuidado maternal foi exemplar, recheada de amor. E a catequese cristã católica por ela transmitida, baseando-se na prática humanista, no cotidiano do convívio solidário, não se furtava de reflexões éticas profundas.
Daí seu desejo de melhor compreender, quando saiu nos jornais, o debate sobre as células-tronco para fins terapêuticos ou mesmo a real razão do encerramento, pela Paróquia local, do funcionamento da escola infantil de vanguarda na cidade, o Externato São Francisco, no edifício lateral da Igreja Matriz da cidade. Assuntos estes diretamente relacionados às irmãs Bertha (Braga Mendonça), diagnosticada com Doença de Alzheimer e vivendo em Belo Horizonte, e Josette, criadora do projeto pedagógico inovador da referida escola, com o alto incentivoe reconhecimento anterior de Frei Osmar Dirks.
Martha dizia que não era uma pessoa importante, mas que as irmãs que residiram em São Lourenço, Joanita e Josette, sim.
Seu bom humor e curiosidade de conhecimento permaneceram até o final de sua jornada.Martha talvez foi, então, mais uma das mulheres brilhantes e ao mesmo tempo ocultas existentes na cidade de São Lourenço.
Mais uma mulher que colaborou ativamente para o crescimento da cidade, a seu modo, do seu jeito, como foi possível ser, como é possível viver, mas com muita dignidade, coragem, força, resistência e persistência. Com afeto!
O SLJornal expressa os sinceros sentimentos e deseja que Deus conforte os corações dos familiares nesse momento de dor! Dona Martha com certeza foi uma mulher a frente de seu tempo e que deixa exemplo para os filhos de coração! Descanse em paz!